Coorte Prospectivo
Incidência de lesão de córnea em terapia intensiva: um estudo de coorte
Santos QF, Stipp MA, Góes FG, Oliveira FA, Paes GO. Incidência de lesão de córnea em terapia intensiva: um estudo de coorte. Acta Paul Enferm. 2023;36:eAPE01552. DOI: http://dx.doi.org/10.37689/acta-ape/2023AO01552
Escrito por: Joandra Aleixo Marques Gonçalves de Souza
A autora declara não apresentar conflito de interesse relacionado a esta publicação e expressões aqui registradas.
Os autores introduzem a temática evidenciando a negligência das equipes de cuidados intensivos com as profilaxias oftalmológicas, a considerar a alta demanda de trabalho nas situações ameaçadoras à vida do paciente crítico, contexto que exige determinadas ações prioritárias. Sendo assim, os cuidados oculares acabam ficando em segundo plano ou até mesmo não são realizados. São citados estudos que demonstram a alta incidência de lesão de córnea e hiperemia ocular nos pacientes internados em unidades de terapia intensiva (UTI), condições que podem contribuir com a ocorrência de sequelas irreversíveis após alta, como perda da visão, dificultando a reabilitação deste paciente, aumentando tempo de internação e inviabilizando seu retorno ao trabalho. Situações como piscar de olhos com frequência menor que 5 vezes por minuto, necessidade de ventilação mecânica invasiva, uso de alguns tipos de medicamentos e realização de procedimentos cirúrgicos, são citados pelos autores como fatores de risco para alterações oculares que demandam cuidados preventivos.
Diante da importância da temática, os autores desenvolveram este trabalho com o objetivo de identificar a incidência de lesão de córnea em pacientes internados na unidade de terapia intensiva e associar os principais fatores de risco com a ocorrência de lesão de córnea nessa população. É um coorte prospectivo, que incluiu 40 pacientes internados na UTI de um hospital privado do Rio de Janeiro (RJ), acreditado pela Joint Commission International (JCI). A população foi avaliada através de dados sociodemográficos, dados extraídos do prontuário e avaliação do paciente beira-leito. Foram analisados: prevalência e incidência dos fatores de riscos, assim como a incidência de lesão na córnea, sexo, procedência, queixa principal, diagnóstico principal, doença pregressa, presença de infecção respiratória, terapêutica medicamentosa, falência de órgãos, ocorrência de hiperemia e edema palpebral, fechamento palpebral, piscar de olhos, área de exposição ocular, edema conjuntival, perda do tônus da musculatura palpebral, ventilação não invasiva, cateter nasal, macro nebulização, ventilação mecânica invasiva (VMI), tubo endotraqueal (TOT), traqueostomia (TQT), fixação do TOT, tempo de internação hospitalar, tempo de internação na UTI, tempo para o aparecimento de lesão na córnea, idade, escala de agitação e sedação de Richmond (RASS), escala de coma de Glasgow, temperatura do ambiente e tempo de sobrevivência até a lesão da córnea.
A maior parte da amostra foi composta por idosos entre 70 e 90 anos, do sexo masculino e com doenças cardiovasculares como principais comorbidades, apresentando Glasgow maior que 13 ou RASS igual ou maior que 0, em uso de antimicrobianos, anti-hipertensivos, diuréticos, sedativos e suporte ventilatório. Em 57,5% dos pacientes ocorreu hiperemia ocular, em 45% o fechamento palpebral parcial, em 42,5% edema palpebral, em 35% edema conjuntival, em 32,5% piscar de olhos menor que 5 vezes por minuto e em 25% dos pacientes ocorreu o ressecamento local. A lesão de córnea incidiu em 20% dos pacientes. Os pacientes foram avaliados entre dezembro de 2019 e fevereiro de 2020.
Os autores concluem citando a hiperemia, a lagoftalmia, o edema conjuntival, o edema palpebral, o piscar de olhos menor que cinco vezes por minuto, o ressecamento ocular, além de Glasgow < 13, uso de sedativos e broncodilatadores, traqueostomia e ventilação mecânica, como fatores de risco para a ocorrência de lesão de córnea, já que alteram o funcionamento da proteção ocular. Além disso, o trabalho multiprofissional foi enfatizado, no sentido de poder contribuir ativamente na prevenção dessas complicações, inclusive identificando problemas que antecedem a lesão de córnea e atuando de forma preventiva. Por fim, os autores discorrem sobre a importância da implementação de práticas assistenciais multiprofissionais com o objetivo de reduzir a ocorrência de lesões de córnea no ambiente de terapia intensiva.
- Aplicabilidade dos resultados observados no atual cenário de atuação dos enfermeiros intensivistas brasileiros
A ocorrência de lesões de córnea é importante, os fatores de risco são facilmente identificáveis no beira-leito, os cuidados oculares profiláticos são simples, de fácil execução, de baixo custo e, portanto, de execução viável. Sensibilizar a equipe de cuidados intensivos quanto aos fatores de risco e complicações que antecedem a ocorrência de lesão de córnea pode contribuir para reduzir a sua incidência no ambiente de terapia intensiva.
- Pontos-chave a serem discutidos
É necessária a discussão a nível multiprofissional dentro das instituições para a elaboração de protocolos assistenciais que estabeleçam as medidas a serem utilizadas pela equipe de acordo com sua estrutura organizacional, recursos, logística e suprimentos.
- Sugestões para pesquisas futuras
Desenvolvimento e validação de protocolos assistenciais ou bundles de prevenção de lesão de córnea, afim de comprovar sua efetividade.
- Limitações do estudo
Estudo unicêntrico, amostra pequena e realizado em serviço privado, o que pode não refletir a real ocorrência de lesões de córnea e subestimar os fatores de risco para sua ocorrência na população brasileira.
Joandra Aleixo Marques Gonçalves de Souza
Especialista pelo Programa de Residência Multiprofissional de Enfermagem em Terapia Intensiva do Hospital Israelita Albert Einstein, pela pós-graduação do Instituto Israelita de Ensino e Pesquisa Albert Einstein e Titulada pela ABENTI em 2022. Experiência em UTI cirúrgica no Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP e na rede privada em São Paulo-SP. Consultora em Terapia Intensiva para estudantes e profissionais da área.